Os homens oceano – sempre “extravasam”
Nada é tão lógico e nada parece tão absurdo quanto o oceano.
Esta dispersão de si mesmo é inerente a sua soberania e é um dos elementos de sua amplidão. A torrente é incessantemente a favor ou contra. Ela só se enlaça para se desenlaçar. Uma de suas vertentes ataca, uma outra entrega. Não há visão como as ondas.
Como pintar estes vazios e estes relevos que se alternam, quase irreais, estes vales, estas camas, estes desvanecimentos de peitorais, estes esboços? Como exprimir estes matagais da espuma, mesclados de montanha e de sonho? O indescritível está ali, em toda parte, no rasgo, no franzir, na inquietude, no desmentido pessoal, no claro-escuro, nos pingentes da nuvem, nas pedras angulares sempre desfeitas, na desagregação sem lacuna e sem ruptura, e no estrondo fúnebre que toda essa demência faz
Vicor Hugo, L’homme qui rit, 1869
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A cabeça não é a de Orfeu mas parece divina. Não navega a cantar e a sangrar pelo rio Ebro. Também não parece eternamente fresca e resplandecente. A ruína atacou-lhe a face – o efeito de estranheza remete para um sublime desfigurado.
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Desliza como despojo ao longo do Hudson, por onde se acumulam outros pedaços de colossos, misturando-se restos arquitectónicos do revivalismo clássico com gigantesca cabeça de vaca destinada a ornamentar um talho entretanto demolido
– o batético acontece.
(imagens e artigo: Git Along, Little Dogies, in the New York Times)